sábado, 1 de setembro de 2007

Como surgiu o ensino da arte nas escolas

As práticas educativas surgem de mobilizações sociais, pedagógicas, filosóficas, e, no caso de arte, também artísticas e estéticas. Quando caracterizadas em seus diferentes momentos históricos, ajudam a compreender melhor a questão do processo educacional e sua relação com a própria vida.

No Brasil, por exemplo, foram importantes os movimentos culturais na correlação entre arte e educação desde o século XIX. Eventos culturais e artísticos, como a criação da Escola de Belas Artes no Rio de Janeiro e a presença da Missão Francesa e de artistas europeus de renome, definiram nesse século a formação de profissionais de arte ao nível institucional. No século XX, a Semana de 22, a criação de universidades (anos 30), o surgimento das Bienais de São Paulo a partir de 1951, os movimentos universitários ligados à cultura popular (anos 50/60), da contracultura (anos 70), a constituição da pós-graduação em ensino de arte a mobilização profissional (anos 80), entre outros, vêm acompanhando o ensino artístico desde sua introdução até sua expansão por meio da educação formal e de outras experiências (em museus), centros culturais, escolas de arte, conservatórios, etc.).

Isto faz ver que as correlações dos movimentos culturais com a arte e com a educação em arte não acometem no vazio, nem desenraizadas das práticas sociais vividas pela sociedade como um todo. As mudanças que ocorrem são caracterizadas pela dinâmica social que interfere, modificando ou conservando as práticas vigentes.

A preocupação com a educação em arte tem mobilizado pesquisadores, professores, artistas, os quais vêm procurando fundamentar e intervir nessas práticas educativas. No Brasil, desde o final dos anos 80 têm-se divulgado inúmeros trabalhos desta ordem, tanto aqueles elaborados aqui quanto os de outros países.

A História considerada, portanto, é aquela que está sendo desenvolvida por professores e alunos em suas práticas e teorias pedagógicas. E, observando a história do ensino artístico, percebe-se o quanto as ações também estão demarcadas pelas concepções de cada época.

Com a criação da Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro, em 1816, tivemos entre nós a instalação oficial do ensino artístico, seguindo os modelos similares europeus; nessa época, a maior parte das academias de arte da Europa procurava atender à demanda de preparação e habilidades técnicas e gráficas, consideradas fundamentais à expansão industrial. Aqui, como na Europa, o desenho era considerado a base de todas as artes tornando-se matéria obrigatória nos anos iniciais de estudo da Academia Imperial. No ensino primário o desenho tinha por objetivo desenvolver também essas habilidades técnicas e o domínio da racionalidade. Nas famílias mais abastas as meninas permaneciam em suas casas, onde eram preparadas com aulas de música e bordado, entre outras.

Nas primeiras décadas do século XX o ensino de arte, no caso, desenho, continuou a apresentar-se com este sentido utilitário de preparação técnica para o trabalho. Na prática, o ensino de desenho nas escolas primárias e secundárias fazia analogias com o trabalho, valorizando o traço, o contorno e a repetição de modelos que vinham geralmente de fora do país; o desenho de ornatos, a cópia e o desenho geométrico visavam à preparação do estudante para a vida profissional e para as atividades que se desenvolviam tanto em fábricas quanto em serviços artesanais.

Os programas de desenho do natural, desenho decorativo e desenho geométrico eram centrados nas representações convencionais de imagens; os conteúdos eram bem discriminados, abrangendo noções de proporção, perspectiva, construções geométricas; composição, esquemas de luz e sombra. Nas Escolas Normais os cursos de desenho incluíam ainda o “desenho pedagógico”, onde os alunos aprendiam esquemas de construções gráficas para “ilustrar aulas”.

Do ponto de vista metodológico, os professores, seguindo essa “pedagogia tradicional “ (que permanece até hoje), encaminhavam os conteúdos através de atividades que seriam fixadas pela repetição e tinham por finalidade exercitar a vista, a mão, a inteligência, a memorização, o gosto e o sendo moral. O ensino tradicional está interessado principalmente no produto do trabalho escolar e a relação professor e aluno mostra-se bem mais autoritária. Além disso, os conteúdos são considerados verdades absolutas.

A partir dos anos 50, além do Desenho, passaram a fazer parte do currículo escolar as matérias Música, Canto Orfênico e trabalhos Manuais, que mantinham de alguma forma o caráter e a metodologia do ensino artístico anterior. Ainda nesse momento, o ensino e a aprendizagem de arte concentram-se apenas na transmissão de conteúdo reprodutivista, desvinculando-se da realidade social e das diferenças individuais. O conhecimento continua centrado no professor que procura desenvolver em seus alunos também habilidades” manuais e hábitos de precisão, organização e limpeza.

A Pedagogia Nova, também conhecida por Movimento da Escola Nova, tem suas origens na Europa e Estados Unidos (século XIX), sendo que no Brasil vai surgir a partir de 1930 e ser disseminada a partir dos ano 50/60 com as escolas experimentais. Sua ênfase é a expressão, como um dado subjetivo e individual em todas as atividades que passam dos aspectos intelectuais para os afetivos. A preocupação com o método, com o aluno, seus interesses, sua espontaneidade e o processo do trabalho caracterizam uma pedagogia essencialmente experimental, fundamentada na Psicologia e na Biologia.

Diferentes autores vêm marcando os trabalhos dos professores de Arte, no século XX, no Brasil, firmando a tendência da Pedagogia Nova. Entre eles destacam-se John Dewey e Viktor Kowenfeld, dos Estados Unidos, e Herbert Read, da Inglaterra.

A Pedagogia Tecnicista, presente ainda hoje, teve suas origens a partir da segunda metade do século XX, no mundo, e a partir de 1970, no Brasil . Nessa Pedagogia, o aluno e o professor ocupam uma posição secundária, porque o elemento principal é o sistema técnico de organização da aula e do curso. Orientados por uma concepção mais mecanicista, os professores brasileiros entendiam seus planejamentos e planos de aulas centrados apenas nos objetivos que eram operacionalizados de forma minuciosa. Faz parte ainda desse contexto tecnicista o uso abundante de recursos tecnológicos e audiovisuais, sugerindo uma modernização do ensino. Nas aulas de Arte, os professores enfatizam um saber construir reduzido aos seus aspectos técnicos e ao uso de materiais diversificados (sucatas, por exemplo), e um saber exprimir-se, na maioria dos casos caracterizando poucos compromissos com o conhecimento da linguagens artísticas. Devido à ausência de bases teóricas mais fundamentadas, muitos valorizam propostas e atividades dos livros didáticos que, nos anos 70/80, estão em pleno auge, apenas de sua discutível qualidade enquanto recurso para o aprimoramento dos conceitos de arte.

Ao lado das tendências pedagógicas tradicionais, escolanovista e tecnicista, surge no Brasil, entre 1961/1964, um importante trabalho desenvolvido por Paulo Freire, que repercutiu politicamente, pelo seu método revolucionário de alfabetização de adultos. Voltado para o diálogo educador-educando e visando a consciência crítica, influencia principalmente movimentos populares e a educação não formal. Retomado a partir de 1971, é considerado nos dias de hoje como uma Pedagogia Libertadora, em uma perspectiva de consciência crítica da sociedade. A partir dos anos 80, acreditando em, um papel específico que a escola tem com relação a mudanças nas ações sociais e culturais, educadores brasileiros mergulham em um esforço de conceber e discutir práticas e teorias de educação escolar para essa realidade. Conscientizam-se de como a escola se configura no presente, com vistas a transforma-la rumo ao futuro. E nos convidam a discutir as ações e as idéias que queremos modificar na educação em arte, como um desafio compromisso com as transformações na sociedade.

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